Candidato do PSL à Presidência da República, Jair Bolsonaro, declarou o seguinte no último dia 30 de julho, em entrevista ao Programa Roda Viva, da TV Cultura: “Não vou falar que vou acabar [com as cotas], porque depende do Congresso. Quem sabe a diminuição do percentual. Não só para universidade, mas para concurso público. Pelo amor de Deus, vamos acabar com essa divisão no Brasil.”

Entenda o contexto

As cotas para o ingresso nas universidades federais e instituições federais de ensino técnico de nível médio são definidas pela Lei 12.711, de 29 de agosto de 2012. A lei determina que 50% das vagas de cada seleção sejam reservadas para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio ou o fundamental, em escolas públicas. Dentro desse percentual, metade das vagas devem ser reservadas aos estudantes cujas famílias têm renda igual ou inferior a 1,5 salário mínimo por pessoa (R$ 1.431, no momento). As cotas raciais também entram nessa conta e são proporcionais à população de pretos, pardos e indígenas de cada unidade da federação, de acordo com o último censo do IBGE.

Já a Lei 12.990, de 9 de junho de 2014, reserva 20% das vagas oferecidas em concursos públicos de órgãos da administração pública federal, autarquias, fundações e empresas públicas e de economia mista controladas pela União, a candidatos autodeclarados pretos ou pardos. Embora a lei federal para a área de educação seja de 2012, políticas de cotas começaram a ser adotadas em universidades brasileiras em 2003. A pioneira foi a Universidade Estadual do Rio de Janeiro. De acordo com o Censo da Educação Superior, feito pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), o percentual de matriculados negros nas universidades públicas federais saltou de 20%, em 2011, para 40%, em 2016.

Como o candidato vai cumprir a promessa

A reportagem procurou várias vezes, por meio de telefonemas, emails e mensagens via WhatsApp, a campanha de Bolsonaro, mas não recebeu informações de como o candidato pretende executar essa proposta de campanha.

O que pode ser feito

O professor da FGV Direito SP, Thiago Amparo, afirma que o presidente da República e seus ministros não podem, por decreto ou portaria ministerial, alterar uma lei aprovada pelo Congresso Nacional. A mudança também não pode ser feita por Medida Provisória, pois esse instrumento legislativo só pode ser usado quando o assunto requer urgência. E mesmo a Medida Provisória precisa ser votada pelo Congresso. Assim, para acabar ou reduzir o percentual de cotas nas universidades e concursos públicos federais, é necessário o envio ao Congresso de projetos de lei que alterem a legislação em vigor.

Para aprovação, é preciso que 257 deputados estejam no plenário e metade mais um deles concorde. Depois, o projeto de lei segue para o Senado, onde é necessário que 41 senadores estejam presentes e metade mais um aprove. As votações são feitas separadamente. Se isso ocorresse, eventuais mudanças não valeriam para as regras de cotas aplicadas nas instituições estaduais e municipais, seja para ingresso de estudantes ou de profissionais via concurso público. Quem manda, nestes casos, são as Assembleias Legislativas e Câmaras Municipais, respectivamente.

O professor da FGV alerta ainda que alterações na legislação atual poderiam ser questionadas no Supremo Tribunal Federal (STF). Isso porque o tribunal já reconheceu a constitucionalidade da reserva de vagas para negros no ingresso nas universidades públicas, em 2012, e nos concursos públicos, em 2017.

Há projetos em tramitação com essa proposta?

Hoje tramitam em conjunto dois projetos de lei que, se aprovados, poderiam restringir as cotas apenas ao critério social. São eles: o PL 2.525, de 2011, de autoria do deputado federal Carlos Manato (PDT-ES), que determina reserva de 20% das vagas de concursos públicos federais para candidatos de baixa e renda, e o PL 5.008, de 2016, do deputado Vinicius Carvalho (PRB-SP), que estabelece a cota social como único critério de seleção para ingresso na educação pública superior e em concurso, eliminando as cotas raciais. Os projetos aguardam análise na Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público da Câmara.

Com informações do Portal Uol Notícias