No dia 17 de março de 2014, a notícia que a Polícia Federal estava nas ruas cumprindo 81 mandatos de busca e apreensão em um posto de combustíveis no Distrito Federal estava nos noticiários brasileiros. Mal se sabia na época, contudo, que aquela operação seria apenas a primeira fase da maior investigação de corrupção já conhecida no País.

Quatro anos depois, a Operação Lava Jato acumula mais de 100 denúncias, 220 condenações, 260 conduções coercitivas, 168 prisões preventivas, 179 acordos de colaboração premiada e R$ 11,5 bilhões previstos em devoluções aos cofres públicos.

E se a efetividade da operação estiver ameaçada? É o que membros da força-tarefa da Lava Jato dizem temer, com a possibilidade de proibição da execução da pena após condenação em segunda instância.

Carlos Fernando dos Santos Lima, procurador do Ministério Público Federal do Paraná, afirmou ao Jornal Folha de São Paulo que a revisão da prisão nestes casos ameaça não apenas a Lava Jato, mas todas as outras grandes investigações do País.

“Na prática, vamos ver um incentivo à impunidade. Evidente que isso vai gerar um prejuízo, uma sensação de desânimo, uma descrença na Justiça”, disse. O procurador ressalta que um dos motores principais para a concretização de acordos de delação premiada é o receio da prisão.

Ele afirma acreditar que muitos deixarão de fazer a delação se tribunais superiores transmitirem a mensagem de que a tramitação dos processos pode levar 20 anos, chegando à prescrição. Em outubro de 2016, por 6 votos a 5, o Supremo Tribunal Federal (STF) passou a permitir a execução da pena com o fim do trâmite em segunda instância.

“Bobagem”

Após a condenação do ex-presidente Lula no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), o assunto voltou a ser discutido, e ministros do STF têm sido pressionados a pautar novo julgamento.

A Constituição prevê, no artigo 5°, que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado. O advogado criminalista Alberto Toron, doutor em Direito Penal pela USP e com clientes na Lava Jato, afirma que é uma bobagem vincular a discussão ao futuro da operação. “A Lava Jato começou quando ainda se permitia que o sujeito aguardasse em liberdade o trânsito em julgado e teve muita eficácia”, diz.

Segundo Toron, o que garantiu o sucesso da operação foram as prisões preventivas decretadas na investigação, que levaram a um grande número de delações premiadas.

O criminalista Figueiredo Basto, pioneiro nas delações premiadas, afirma enxergar a Lava Jato atrelada a fundamentos mais sólidos, como às boas investigações realizadas pelo Ministério Público e pela Polícia Federal. Segundo ele, a operação não depende das prisões em segunda instância.

O advogado ressalta que a Lava Jato precisa se submeter à Constituição e que, antes da operação, a jurisprudência era muito pacífica em torno do entendimento de que o réu só poderia ser preso após o trânsito em julgado.

Luiz Flávio Borges D’Urso, ex-presidente da OAB-SP e doutor em Direito Penal pela USP, discorda que a proibição da condenação em segunda instância seja um golpe contra a operação. “A Lava Jato não depende hoje de uma posição do STF, ela existe por si mesma, pela força de suas investigações, pelo crédito que tem na sociedade.”

Segundo ele, a decisão do Supremo de outubro de 2016 permitiu a possibilidade da prisão em casos específicos, mas não foi uma determinação. Ele também afirma que a Constituição não dá margem à interpretação que se colocou. “O que vimos foi uma diretriz interpretada equivocadamente pelos tribunais inferiores, que passou a se tornar uma regra.”

Nesta sexta-feira, 16, haverá em Porto Alegre (RS) uma entrevista coletiva para marcar os quatro anos da Lava Jato. Estarão presentes os coordenadores das forças-tarefa de Curitiba (PR), Porto Alegre (RS), Rio de Janeiro (RJ) e Brasília (DF). A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, também estará na capital gaúcha, onde participará de uma reunião de trabalho das forças-tarefa da Lava Jato.

Com informações do Jornal Folha de São Paulo