A seis dias do Dia Internacional Contra a Corrupção, no próximo domingo (9), especialistas debateram no Senado sugestões de enfrentamento à corrupção. Solicitada pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), a audiência pública realizada hoje (4), pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), foi marcada pela defesa de medidas de reforma legislativa, administrativa e institucional elaboradas por mais de 300 entidades brasileiras e já apresentadas à Câmara dos Deputados, ao Senado e a outros órgãos de Estado.

Encabeçada pela organização não governamental (ONG) Transparência Brasil, a iniciativa reúne 70 propostas de instituições e da sociedade civil. As sugestões foram discutidas por mais de 200 especialistas no tema e sistematizadas por pesquisadores da Fundação Getúlio Vargas (FGV). À ela foram acrescentados alguns exemplos internacionais de boas práticas anticorrupção. Apelidado de Novas Medidas Contra a Corrupção, o pacote de propostas é considerado um passo além das dez medidas apresentadas pelo Ministério Público Federal (MPF), em 2015 – e que deram origem a um projeto de lei aprovado pela Câmara dos Deputados, mas com muitas modificações inseridas por parlamentares.

Segundo o representante da Transparência Internacional, Bruno Brandão, as novas medidas oferecem soluções permanentes para o enfrentamento a um problema que tem causas sistêmicas e, portanto, deve ser combatido com respostas institucionais. Brandão lembrou que, no ano passado, o Brasil caiu da 79ª para a 96ª posição no ranking mundial que a Transparência Internacional elabora anualmente, medindo a percepção da corrupção em 180 países e territórios.

“Infelizmente, o Brasil foi um dos países em que a percepção da corrupção mais piorou nos últimos cinco anos”, disse Brandão, explicando que, em função da Operação Lava Jato, a piora inicial já era esperada, mas que o resultado de 2017 surpreendeu. “A corrupção se tornou mais perceptível em todos os países que começaram a enfrentá-la de forma mais contundente. Com isso, há uma piora da percepção do problema, mas, depois de algum tempo, isso tende a se transformar em uma percepção de maior controle e enfrentamento ao problema”, acrescentou Brandão, frisando que, no Brasil, essa “estabilização” chegou a começar, mas foi abortada por novas denúncias.

“Isso ocorreu porque a Lava Jato alcançou a Presidência da República, o que projetou uma percepção de impunidade mundo afora. Mais grave ainda foi o que deveria ter ocorrido e não aconteceu: em termos de combate à corrupção, o Brasil deveria ter começado a olhar para a frente. É muito importante olhar para trás, investigar e punir os crimes, mas se o país não olhar para a frente e buscar soluções, esse enfrentamento será um voo curto, uma luta com pouco fôlego e fadada ao fracasso”, afirmou Brandão, destacando a importância do país “olhar para as raízes do problema e propor soluções sistêmicas para algo que é sistêmico”.

Pesquisadora na área de políticas públicas e legislação de enfrentamento da corrupção da FGV, Isabel Cristina Veloso de Oliveira, comentou que as dez medidas apresentadas pelo MPF foram “uma espécie de faísca” que deve ser aprimorada. Segundo ela, a ênfase das sugestões das novas 70 propostas é na prevenção, enquanto a iniciativa do MPF focava mais na punição.

“Partimos de uma pergunta: o que seria necessário, do ponto de vista legislativo, para aprimorar a detecção, a prevenção e também a punição da corrupção? Nossa proposta é um ponto inicial. Contamos com o apoio popular e com o Congresso Nacional para que as sugestões sejam aperfeiçoadas e, de repente, aprovadas”, disse a pesquisadora, destacando, entre as 70 sugestões, a desburocratização do Estado e a regularização do lobby.

“A desburocratização pretende, basicamente, ajudar a eliminarmos o chamado jeitinho brasileiro, tornando a oferta de serviços públicos o mais transparente possível. Quando o Estado dificulta o acesso dos cidadãos até mesmo aos direitos mais básicos, está criando complicações para ofertar facilidades”, disse Isabel antes de defender a regulamentação do lobby como forma de desestimular a corrupção no setor privado. “Trata-se de uma atividade legítima, de influência de interesses na criação de políticas públicas. No nosso entendimento, seria interessante regulamentá-la para a sociedade saber como e quando ele acontece. E para que haja espaços mais equânimes [de participação], para que diferentes interesses tenham acesso ao Poder Público.”

As duas propostas foram endossadas pela senadora Ana Amélia, que presidiu parte da audiência. “A desburocratização fala por si. E quanto ao lobby, há um preconceito enorme nesta casa; de entender que, quanto mais claro estiver quem defende o quê, representando a quem, mais transparência. Porque as instituições fazem lobby aqui [no Congresso Nacional]. O Ministério Público, o Poder Judiciário, os empresários, os sindicalistas, todos. Então, vamos botar a cara. Esta é uma questão importante”, defendeu a senadora.

Embora só vá assumir o cargo em fevereiro de 2019, o senador eleito, delegado Alessandro Vieira (Rede-SE), participou da audiência e disse ser indispensável transformar o combate à corrupção em uma política de Estado. “Não precisamos de heróis. Precisamos de instituições fortes, capazes de fazer o combate cotidiano. Porque a corrupção faz parte do cotidiano da sociedade. E se não conseguirmos transformar isso em uma política de Estado não teremos feito nada, já que os heróis cansam, ou são vencidos, e volta o mesmo sistema, que se mantém muito sólido e bem estabelecido, independente das prisões que já foram realizadas”.

Com informações Agencia Brasil