A decisão da Caixa Econômica Federal de reduzir para 4,99% ao mês os juros do cheque especial reacendeu as discussões sobre as razões pelas quais essa modalidade de crédito tem taxas que ultrapassam 300% ao ano. O Banco Central estuda medidas para baixar esses encargos. As novas regras ainda estão em discussão, mas uma das possibilidades é a de que os bancos possam cobrar tarifas para que os clientes tenham disponível o acesso a determinado limite de recursos. A mudança, segundo o BC, abriria espaço para a redução dos juros da linha  — os mais caros do mercado, ao lado dos encargos do cartão de crédito.

Em audiência na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara, na semana passada, o presidente da instituição, Roberto Campos Neto, disse que, atualmente, o sistema permite que as taxas sejam modificadas pelos bancos de acordo com o perfil do cliente. Assim, é comum que clientes com histórico de adimplência ou com mais recursos na conta-corrente tenham limites maiores no cheque especial, embora, normalmente, não utilizem os recursos disponíveis. Na prática, “quem tem o limite alto e nunca usa tem esse benefício porque está sendo custeado por quem tem limite baixo e usa muito”, afirmou Campos Neto.

Para o educador financeiro do DSOP, Reinaldo Domingos, o cheque especial seria um instrumento razoável de ser usado por quem tem orçamento apertado se houvesse uma regra que limitasse os juros à taxa Selic (atualmente de 5% ao ano). Mas, hoje, ele enxerga na modalidade uma verdadeira armadilha.

“Não recomendaria o cheque especial. É muito caro, e a melhor opção seria uma conta garantida, como a poupança. Mesmo com os juros baixando, o cheque tem o problema de que, em nove meses, você dobra sua dívida”, adverte. Reinaldo acredita que cortes nas taxas podem empurrar outros bancos na mesma direção, o que seria uma boa estratégia, pois os clientes tenderiam a migrar para quem oferecesse mais vantagens.

O presidente do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal (Corecon-DF), César Bergo, explica a razão para as taxas continuarem estratosféricas. “Existe uma diferença básica em algumas linhas de crédito, como de empréstimo e de financiamento. Quando falamos em financiamento, há uma função para a destinação, a compra de um bem, que é a garantia dos bancos. Já em empréstimos, como o cheque especial, não existe uma destinação do dinheiro, e os bancos usam o risco de inadimplência para manter os juros altos.” Para Bergo, “quando a Caixa, como banco do governo, tenta puxar uma redução, quem paga a conta é o contribuinte”, pois (a Caixa) não tem acionistas. “É uma política de governo que não considero correta”, disse.

Perfil

As taxas para pessoas jurídicas e físicas são estabelecidas pelos bancos de acordo com o perfil do cliente. Até setembro passado, a dívida média desse tipo de crédito era de R$ 26.425, conforme Relatório do Banco Central sobre o saldo devedor. O cheque especial é responsável por 52% da inadimplência no sistema financeiro, segundo levantamento da Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) e do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil). A pesquisa mostra também que as pessoas contraem novas dívidas para saldar débitos antigos, sobretudo as que consideram essenciais.

Tal como o analista de recursos humanos Péricles Viana, 29, que precisou entrar no especial para manter as despesas da casa. Resultado: ficou inadimplente. “Fui usando como se fizesse parte do meu salário, até perceber que estava virando uma bola de neve e que eu precisava quitar a dívida”. Ele diz que levou nove meses para pagar tudo, devido aos juros. “Não pegaria novamente nem se diminuíssem a 1% por mês. Não vale a dor de cabeça”.

A contadora Renata Consuelo conta que, por pouco, também não ficou com o nome sujo devido ao cheque especial que pegou na Caixa. “Demorei a pagar porque meu salário cobria, e eu usava de novo. Passei por uma situação financeira complicada. Os juros são muito altos e é muito difícil não deixar acumular.”

Quanto cobra cada um

 

Juros do cheque especial à pessoa física nos principais bancos*

 

Banco — Ao mês — Ao ano

 

Santander — 14,73% — 420,01%
Itaú Unibanco — 12,44% — 308,43%
Bradesco — 12,26% — 300,6%
Banco do Brasil — 12,17% — 296,9%
Caixa (taxa em outubro) — 9,38% — 193,28%
Caixa (nova taxa) — 4,99% — 79%

 

 

 

(*)com informação do Correio Braziliense